Rio : preconceito e sensacionalismo na barbárie

Durante as transmissões de TV sobre a chacina na escola de Realengo, vi coisas como a irmã do assassino dizendo que ele parecia um muçulmano, que deixou a barba crescer, que não saía da internet. Noutra disseram que ele seria aidético como possível "explicação" para a matança. Noutro disseram que sofreu bullying na escola. Por fim, na leitura da carta deixada por Wellington, enxergaram em alguns trechos a influência islâmica (ter que ser coberto por uma virgem, impuros não devem tocar o corpo, etc), embora citasse Jesus (integra da carta ).

O oportunismo das emoções a mil deu margem a demonizar a Aids, o Islã, os nerds e os próprios colegas pelo bullying. Atento à associação dos fatos ao "terrorismo islãmico" pela mídia, o Centro Islâmico Brasileiro publicou nota condenando o atentado (creio que só a Band noticiou isso). Aqui vai um trecho interessante da visão dessa religião sobre os assassinatos, que por sua vez joga a culpa de crimes para os "sem fé, espiritualidade ou religiosidade", ou seja, para os ateus, que não têm nada a ver com isso e, no caso, também são discriminados na nota:

"...O Profeta Mohammad (S.A.A.S.) disse: “Talvez a ruína do mundo inteiro é mais fácil para Deus do que o derramamento de uma única gota de sangue inocente.”

Entre os piores crimes que o ser humano pode cometer está o assassinato, pois é um crime opressor, brutal e injusto, que foi condenado não apenas pelo Islam, mas também por todas as demais doutrinas celestiais. Todas, sem exceções, demandam as mais severas punições ao assassino, e consideram o mesmo um indivíduo sem fé, espiritualidade ou religiosidade alguma.

Em nome de milhares de muçulmanos que vivem no Brasil, o Centro Islâmico no Brasil condena veementemente o ataque criminoso infligido contra a Escola Municipal Tasso da Silveira, uma instituição de ensino, ou seja, um local ligado ao conhecimento, ao bem e a paz. Um ataque trágico que levou o pânico e o medo a estudantes e professores.

Afirmamos sem ressalvas que criminosos psicopatas e assassinos não podem clamar que possuem qualquer ligação com uma doutrina divina, pois definitivamente as religiões não incentivam este tipo de ato vil e abominável. A mensagem divina afirma de forma bem clara: “Quem mata uma alma inocente será considerado como se tivesse matado a humanidade inteira, e quem salva uma alma será considerado como se tivesse salvado toda a humanidade.” Diante disso, podemos ressaltar a imensa e imperdoável gravidade de se atacar, agredir e assassinar crianças e jovens inocentes, que são os anjos da vida, e de forma inata carregam consigo a alegria, o bem, a inocência e toda uma perspectiva de futuro. ..."

Outra coisa preocupante é o sensacionalismo, a superexposição de pessoas e emoções, em busca de audiência. Telejornais transmitidos ao vivo do local deram o tom de grande importância ao fato, que é relevante, mas propagam o bem-sucedido atentado, dando ao assassino e de referências a crimes similares nos Estados Unidos uma importância que pode servir de modelo a outros desequilibrados. Não me lembro de ter visto, em pleno calor dos fatos do 11 de setembro nos Estados Unidos, imagens de corpos e depoimentos explosivos em emoção como os que vimos por aqui.

Do ponto de vista da mídia, Wellington venceu. Dois dias como assunto quase único na mídia, planejamento perfeito (carta, lençol, armas com carregador rápido, muita munição, oportunidade de festa na escola para enganar o porteiro, suicídio previsto). Teve um "gran finale" para uma vida medíocre. Não disse por que matou, mas personalizou a própria morte, para ser lembrado no futuro, bem ou mal. Quis ser o pioneiro nesse tipo de ação espetacular, que pode abrir o caminho para outros loucos fazerem o mesmo. Pediu no final o perdão divino, através da caridade de alguém que ore por ele. Pensou em tudo, menos que deixaria um rastro de preconceitos pela interpretação do seu ato insano.