domingo, 7 de setembro de 2014

O projeto de Marina e os potenciais prejuízos à classe média

Conceituar "classe média" com parâmetros econômicos não é preciso, porque momentaneamente as pessoas podem ter atingido certos patamares de renda e serem "fotografadas" juntas, não se constituindo uma amostra homogênea. Há os que estão subindo, os que descem e os que sempre estiveram ali, cada um contendo valores e visões diferentes a partir de suas histórias de vida. 
Não importa o conceito, o fato é que a conjuntura política pode afetar certos grupamentos sociais mais que a outros. Hoje boa parte da classe média está envenenada contra Dilma pela mídia, pois consome os produtos de formação de opinião (Globo, VEJA, etc) que fazem campanha diuturna contra o governo como partidos. Diz que nada presta, que tudo é corrupção, e que quer se livrar de "tudo isso" de qualquer jeito. E a eleição está aí, e voto revoltado é como dirigir embriagado: grande chance de acabar em desastre. 

Dilma promete mais do mesmo com algumas mudanças setoriais, ou seja: manter nível de emprego e salários, manter a inflação sob controle mesmo em patamares altos, manter todos os programas sociais, melhorar a educação e a saúde, etc. Nenhuma manobra brusca está no cenário.

Os principais candidatos de oposição prometem "mudar tudo". Aécio tergiversa, esconde o jogo, fala por códigos e a verdade sobre seu programa de governo é mais conhecida pelo que dizem seus apoiadores que por ele mesmo. Mas a síntese está nas linhas do neoliberalismo do Consenso de Washington, embora não queira falar muito sobre isso porque nos últimos dias apela ao populismo para tentar se levantar depois da ultrapassagem rápida de Marina Silva, que o deixou em 3º lugar nas pesquisas. 

Já Marina Silva tem um programa detalhado no mesmo rumo das propostas de Aécio e por isso fica mais fácil analisar e criticar. Mesmo copiado, colado, retralhado, emendado, o que se pode aferir é que terá alto impacto em todos os do andar de baixo, os assalariados, pequenos empresários e outros que, embora atribuam à "providência divina" suas prosperidades momentâneas têm nas políticas econômicas e sociais de Lula e Dilma o motivo da ascensão. Negam  ou não enxergam isso. O fato é que tudo que os levou a relativa situação de bem estar pode estar com os dias contados. 

Hoje é muito comum nas casas de classe média emergente vermos filhos estudando para concurso, sem trabalhar, até passando dos 30 anos morando com os pais. Recusam-se a trabalhar para ganhar pouco e têm apoio dos seus patrocinadores, em especial dos que ralaram muito na vida para dar-lhes o melhor e são superprotetores. Só existe o concurseiro porque existem concursos, e nos governos Lula e Dilma a máquina do estado foi recomposta depois de anos de sucateamento. Há concursos para tudo a toda hora, e isso alimenta uma indústria com grande massa de interessados.

Aí vêm os programas neoliberais falando em "equilíbrio fiscal", "redução da máquina pública", "eliminação de ministérios", "recomposição das margens de lucro das empresas", "privatização de estatais", "estado mínimo", redução do estado" e outros eufemismos para dizer que vão demitir funcionários públicos, acabar com concursos, e os que ficarem terão salários congelados e reduzidos pela corrosão inflacionária. Isso não é novidade: nos anos FHC foi praticado, afastando o interesse das pessoas pelos empregos públicos e jogando-as no desemprego. 

Essa política impõe também o fim do reajuste do salário mínimo acima da inflação, que é um dos motores da economia hoje ao aumentar o poder de compra de vastos setores da economia a partir dos lugares mais pobres, movendo cadeias produtivas que fortalecem o mercado interno. Milhões de empregos são criados a partir dessas compras dos mais pobres. Uma parte da classe média que hoje prospera depende disso, talvez sem saber. E vai ver seus negócios refluírem sem entenderem bem o que está acontecendo quando o arrocho salarial vier seguido de recessão. 

A oposição irresponsavelmente aponta com tarifaços nos preços dos combustíveis e da energia, acusando Dilma de estar quebrando a Petrobrás e as empresas de energia, o que é falso. Há interesses de acionistas nesses aumentos e eles apostam na vitória da oposição para ter seus lucros ampliados. Exagero? É só ver como as ações sobem à medida que a mídia fala que a oposição tem chances de vencer. A classe média, prejudicada com recessão e arrocho salarial vai ter uma queda real da qualidade de vida com esses aumentos. 

Na política cambial a oposição também critica a valorização do Real e aponta para levar o dólar a R$ 3 para equilibrar as contas externas. Isso significa que todos os produtos de alto valor agregado, como eletrônicos e veículos, automaticamente aumentarão de preços por usarem componentes importados. E para quem está se esbaldando de viajar ao exterior como nunca significa fim de festa. A desvalorização do Real inviabilizará para muita gente o sonho de conhecer outros países porque tudo ficará muito caro. 

E os impostos? Com Lula e Dilma houve algumas reduções, inclusive de IPI para veículos, o que deu acesso a muita gente realizar o sonho do primeiro carro. E da linha de eletrodomésticos como fogões, geladeiras, etc. No neoliberalismo não há espaço para "renúncias fiscais". Os  impostos devem aumentar para equilibrar as contas públicas. Além disso, como já vimos nos anos FHC, a tabela do imposto de renda deve ficar congelada, forçando a classe média a pagar cada vez mais todo ano. 

A classe média também corre riscos no crédito ao consumidor e para seus negócios. O programa de Marina Silva é claro quando diz (pág. 60) que vão acabar com os subsídios nos financiamentos agropecuários e imobiliários e tirar os bancos públicos da concorrência com os bancos privados. Isso significa que para milhões de famílias que hoje chegaram à classe média no campo porque o PRONAF incentiva a produção vão ter perdas pesadas. E comprar a casa própria vai ficar mais caro com o aumento dos encargos do Minha Casa, Minha Vida. 

No geral, com a proposta de "Banco Central independente" e "fortalecimento dos bancos privados" haverá aumento das taxas de juros e redução do poder de compra das famílias. Isso enfraquece toda a economia, em especial comerciantes e produtores industriais e rurais de pequeno porte, que sentirão os impactos de uma clientela sem dinheiro para comprar. Quem conseguiu comprar um carro não terá dinheiro para consertá-lo, e lá se vai a oficina do Pedrinho. Quem comprou uma casa não terá dinheiro para reformá-la e lá se vai a loja de materiais da dona Maria. Sumindo o dinheiro dona Edilene não terá mais clientela para os produtos que vende de casa em casa ou no local de trabalho. 

Os aposentados da classe média também serão afetados por eventual vitória de Marina, que no seu programa de governo fala em usar recursos dos fundos de pensão para emprestar aos bancos privados, ou seja, pondo em risco os benefícios futuros. Muitos deles ajudam filhos e netos jovens a tentar melhores oportunidades a partir de concursos, e ficarão sem condições de prestar tal provimento também pelos arrochos gerais por tarifaços, impostos e congelamento da tabela do IR. 

Aí voltamos aos nossos gloriosos jovens estudantes. Com a desvalorização do real e corte dos programas sociais voltaremos aos anos FHC: universidades e escolas técnicas sem dinheiro, sucateadas, demitindo ou não contratando professores e programas como o FIES, PROUNI e Ciência sem Fronteiras tendendo a desaparecer. Onde esse tipo de programa econômico foi aplicado o que se vê é o desemprego de jovens em larga escala. Na Espanha, por exemplo, mais da metade não consegue emprego e acaba migrando ou partindo para o subemprego e marginalidade. 

Nisso os concurseiros, que não terão mais concursos e se tiverem os salários já não serão os mesmos, com o dinheiro dos pais escasseando, vão ser chamados a participar dos tempos bicudos da pior maneira possível: entrando no mercado de trabalho mais velhos, sem experiência nem competitividade, aceitando funções desqualificadas para seu nível de formação e com baixos salários.

Isso é terrorismo contra Marina e Aécio? Claro que não. São antevisões com base em situações reais que já vivemos aqui e no mundo todo. Quem quiser pagar para ver vote neles, mas, por favor, não reclame depois na minha presença, ok? Se seu voto somente te prejudicasse o problema seria seu, mas eu também vou ser vítima dele, por isso não espere complacência para o que um ato irresponsável, impensado ou por ódio pode nos trazer de más consequências. 

Votar irresponsavelmente por impulso ou ódio é tão insensato como diante de um problema achar que o suicídio pode resolver a vida. Pare, pense, pondere, olhe em volta, analise e decida o melhor para o seu futuro, dos seus filhos e da sua família. Já vimos esse filme antes, com messiânicos salvadores da pátria falando no novo mas contrabandeando as velhas práticas políticas para favorecer aos mais ricos. 







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