Reprodução do editorial da Carta Maior de hoje.
QUÃO LONGE DO ABISMO OBAMA NOS LEVARÁ?
A Câmara dos EUA aprovou o pacote orçamentário republicano que adicionava pouco mais de US$ 900 bi ao teto da dívida pública dos EUA, valor suficiente para Obama governar alguns meses e ficar novamente à mercê de concessões do extremismo neoliberal. Como previsto, o Senado de maioria democrata rejeitou o projeto e tem até a madrugada deste domingo para ampliar a margem de manobra fiscal do Presidente. Ainda que contorne as armadilhas montadas pelos republicanos, Obama perdeu um pedaço precioso de sua credibilidade. Para saciar o conservadorismo ortodoxo, o democrata já estreitou de modo perverso o acesso dos idosos à saúde pública, através do Medicare. Não teve o mesmo rigor ao comprometer as contas do Estado para salvar o sistema financeiro da crise. Espremido, comprometeu-se agora a cortar cerca de US$ 2,7 trilhões em investimentos públicos nos próximos anos, amordaçando a própria margem de manobra na campanha eleitoral de 2012. O discurso claudicante, a musculatura política complacente sugere alguém disposto apenas a mitigar a aplicação do receituário ortodoxo que originou a crise. Se um dia personificou a esperança numa superação progressista da lógica que levou o capitalismo ao seu maior colapso desde 1929, hoje é a imagem gasta da rendição. Obama até certo ponto é refém das circunstancias. As bases operárias e socialistas que pavimentaram o New Deal nos anos 30 não existem mais. Mas já era assim há quatro anos quando disputou com a extrema direita e venceu. Desde então, de recuo em recuo, redefiniu seu espectro político fixando estacas regressivas em Guantánamo, no Afeganistão e na rendição a Wall Street. Sobretudo, porém, trocou de interlocutores. Obama é pop. Tem mais de nove milhões de seguidores no Twiter. Fica atrás apenas de Lady Gaga e do não menos pop Justine Bieber. Mas assim como o Twiter não faz de Gaga uma Rosa de Luxemburgo, Obama não se tornou um Roosevelt digital. Enquanto dispara apelos à mobilização virtual contra o arrocho republicano, cede na prática a essa lógica a ponto de devolver legitimidade à agenda que havia derrotado nas urnas. Hoje, o mundo perplexo sabe o que o Tea Party quer e quão perto do abismo isso significa. Mas ninguém sabe ao certo o que quer Barack Obama. E a que distancia do abismo a sua tibieza nos deixará.
(Carta Maior; Sábado, 30/07/ 2011)
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