Pertenço a uma geração que pegou a descendente do "milagre econômico" dos anos 70 e teve que ralar para botar comida em casa desde cedo. Aos 20 anos trabalhava no BB, pagava minha faculdade e todos os meus gastos. Aos 22 estava casado, antes da formatura. Aos 25 saía do Rio para trabalhar em Fortaleza, deixando para trás toda a história de vida. E não era para ganhar nada parecido na época com os R$ 10 mil que o governo está oferecendo aos médicos agora. Durante toda a carreira como engenheiro não cheguei a receber esse valor, mesmo num banco estatal. E enfrentei condições ruins de trabalho. Fazia parte.
Minha geração, talvez por ter passado por essa experiência, não quis que seus filhos passassem pelo mesmo. Alguns acabaram criando filhos superprotegidos, desses que agora estão aí beirando os 30 anos morando com os pais, fazendo superespecializações uma atrás da outra ou viraram concurseiros profissionais buscando altos salários no dia que entrarem no mercado de trabalho. E os pais de certa forma concordam com isso. Para os filhos, com o queijo certo (vide o livro "Quem mexeu no meu queijo") pelo acolhimento paternal, resta a tranquilidade de continuar buscando o melhor sem se preocuparem com o resto, já que os pais seguram as barras.
Hoje aposentado olho as trajetórias dos amigos e parentes que chegaram ao final das carreiras profissionais situados nas classes A e B de renda. Os da classe A, burgueses, donos de negócios, têm uma solução para os filhos que não saem dos ninhos: botam para trabalhar com eles, nem que seja por figuração. Quem saber um dos filhos não leva jeito para a coisa e lhe garante uma sucessão tranquila quando se afastar do negócio, mantendo-lhe a renda?
Já os da classe B, altos funcionários públicos, de estatais e mesmo de empresas privadas, que fizeram planos de previdência complementar e fizeram poupanças e investimentos em títulos e ações, passam por um momento de crise. Quem acreditou que os juros de FHC continuariam para toda a vida, recebendo sem trabalho nem risco algo em torno de 1% ao mês já descontada a inflação pelas aplicações no mercado financeiro, agora se vê com algo em torno de 0,4%, se for algo realmente "prime". Com a inflação na faixa dos 6% e a SELIC em 8,5%, a realidade hoje é de país capitalista avançado, onde hoje se paga muito pouco para dinheiro em aplicações.
Esse desabamento de renda aconteceu no período Dilma, pois até o fim do governo Lula o tucano Meirelles garantia no Banco Central as altas taxas de juros impostas pelos especuladores e bancos. Em menos de 1 ano Dilma reduziu a SELIC praticamente à metade, e trouxe os juros reais para a faixa dos inacreditáveis (diante do histórico) 2% ao ano. Como quem lê a Veja está nas faixas A e B, e o discurso é o do governo ladrão, que rouba nos impostos, etc, é normal que os filhos das pessoas que estão vendo o padrão de vida cair por conta da queda dos juros ouçam em casa praguejamentos contra Dilma, Lula e o saudosismo do FHC.
E aí, o que tem a ver isso com o "gigante adormecido", aquela galera que foi ás ruas achando que o Brasil foi descoberto agora por eles? Uma parte pode ter sido aquela cujo queijo foi mexido. Aquela que agora chega em casa e começa a ver restrições a uso do carro, a dinheiro para a balada, para viagens, para os eletrônicos de última geração e até aqueles toques tipo "não quer fazer um concurso para algo mais fácil" ou "não está na hora de parar de se especializar e começar a trabalhar de verdade?". A crise da especulação financeira pode estar solapando o padrão de vida dos lares da classe média e tirando da cama os que dormiam o sono tranquilo do mundo sem solavancos.
Qual a alternativa que o capitalismo teria para os "adormecidos"? O empreendedorismo. O Brasil, com taxas reais de juros na base de 14%, não tinha espaço para empreendimentos com retorno de pelo menos 20%. Muitos projetos foram engavetados porque era mais fácil botar o dinheiro num papel e receber os rendimentos sem risco nem trabalho. Agora que os juros reais estão na faixa dos 3%, seria a hora de criar negócios que rendam mais que isso. A economia deveria estar passando por um movimento de investimentos para escapar da baixa (em termos brasileiros) remuneração do capital no sistema financeiro. Não está, porque o mesmo "adormecido" acompanha o sebastianismo dos juros altos dos seus pais. São os que acreditam nos urubólogos da Globo que noticiam catástrofes econômicas 24 horas por dia há 10 anos.
Os recentes protestos tiveram uma componente golpista para tirar Dilma e colocar alguém que voltasse ao passado de juros altos. Fracassaram, mas não desistiram. Insistem na inflação sem controle, no desastre das contas externas, no pibinho e na necessidade, claro, de aumentar os juros para qualquer coisa. Os próximos meses deverão consolidar a vitória da política anti-juros, mas ficará faltando o empreendedorismo em especial desses que agora sentem que o queijo começa a rarear. Alguns entenderão as mudanças, outros ficarão no mantra do "governo ladrão, que cobra altos impostos e não tem serviços padrão fifa".
Minha geração, talvez por ter passado por essa experiência, não quis que seus filhos passassem pelo mesmo. Alguns acabaram criando filhos superprotegidos, desses que agora estão aí beirando os 30 anos morando com os pais, fazendo superespecializações uma atrás da outra ou viraram concurseiros profissionais buscando altos salários no dia que entrarem no mercado de trabalho. E os pais de certa forma concordam com isso. Para os filhos, com o queijo certo (vide o livro "Quem mexeu no meu queijo") pelo acolhimento paternal, resta a tranquilidade de continuar buscando o melhor sem se preocuparem com o resto, já que os pais seguram as barras.
Hoje aposentado olho as trajetórias dos amigos e parentes que chegaram ao final das carreiras profissionais situados nas classes A e B de renda. Os da classe A, burgueses, donos de negócios, têm uma solução para os filhos que não saem dos ninhos: botam para trabalhar com eles, nem que seja por figuração. Quem saber um dos filhos não leva jeito para a coisa e lhe garante uma sucessão tranquila quando se afastar do negócio, mantendo-lhe a renda?
Já os da classe B, altos funcionários públicos, de estatais e mesmo de empresas privadas, que fizeram planos de previdência complementar e fizeram poupanças e investimentos em títulos e ações, passam por um momento de crise. Quem acreditou que os juros de FHC continuariam para toda a vida, recebendo sem trabalho nem risco algo em torno de 1% ao mês já descontada a inflação pelas aplicações no mercado financeiro, agora se vê com algo em torno de 0,4%, se for algo realmente "prime". Com a inflação na faixa dos 6% e a SELIC em 8,5%, a realidade hoje é de país capitalista avançado, onde hoje se paga muito pouco para dinheiro em aplicações.
Esse desabamento de renda aconteceu no período Dilma, pois até o fim do governo Lula o tucano Meirelles garantia no Banco Central as altas taxas de juros impostas pelos especuladores e bancos. Em menos de 1 ano Dilma reduziu a SELIC praticamente à metade, e trouxe os juros reais para a faixa dos inacreditáveis (diante do histórico) 2% ao ano. Como quem lê a Veja está nas faixas A e B, e o discurso é o do governo ladrão, que rouba nos impostos, etc, é normal que os filhos das pessoas que estão vendo o padrão de vida cair por conta da queda dos juros ouçam em casa praguejamentos contra Dilma, Lula e o saudosismo do FHC.
E aí, o que tem a ver isso com o "gigante adormecido", aquela galera que foi ás ruas achando que o Brasil foi descoberto agora por eles? Uma parte pode ter sido aquela cujo queijo foi mexido. Aquela que agora chega em casa e começa a ver restrições a uso do carro, a dinheiro para a balada, para viagens, para os eletrônicos de última geração e até aqueles toques tipo "não quer fazer um concurso para algo mais fácil" ou "não está na hora de parar de se especializar e começar a trabalhar de verdade?". A crise da especulação financeira pode estar solapando o padrão de vida dos lares da classe média e tirando da cama os que dormiam o sono tranquilo do mundo sem solavancos.
Qual a alternativa que o capitalismo teria para os "adormecidos"? O empreendedorismo. O Brasil, com taxas reais de juros na base de 14%, não tinha espaço para empreendimentos com retorno de pelo menos 20%. Muitos projetos foram engavetados porque era mais fácil botar o dinheiro num papel e receber os rendimentos sem risco nem trabalho. Agora que os juros reais estão na faixa dos 3%, seria a hora de criar negócios que rendam mais que isso. A economia deveria estar passando por um movimento de investimentos para escapar da baixa (em termos brasileiros) remuneração do capital no sistema financeiro. Não está, porque o mesmo "adormecido" acompanha o sebastianismo dos juros altos dos seus pais. São os que acreditam nos urubólogos da Globo que noticiam catástrofes econômicas 24 horas por dia há 10 anos.
Os recentes protestos tiveram uma componente golpista para tirar Dilma e colocar alguém que voltasse ao passado de juros altos. Fracassaram, mas não desistiram. Insistem na inflação sem controle, no desastre das contas externas, no pibinho e na necessidade, claro, de aumentar os juros para qualquer coisa. Os próximos meses deverão consolidar a vitória da política anti-juros, mas ficará faltando o empreendedorismo em especial desses que agora sentem que o queijo começa a rarear. Alguns entenderão as mudanças, outros ficarão no mantra do "governo ladrão, que cobra altos impostos e não tem serviços padrão fifa".