Denunciar corrupção é muito bom, especialmente se for ao vento, sem qualquer responsabilidade pela apuração dos fatos e criação de mecanismos de supervisão para evitar novos eventos. Para a imprensa, significa audiência garantida. Para as pessoas, ficam as sensações de indignação ao ódio, passando pelo prazer sádico de ver gente indo presa ou sendo levada à execração pública. O difícil é zelar por fazer as coisas direito, em um mundo onde as oportunidades estão escancaradas aos ladrões.
Participei da Conferência Latino-Americana Brasil -OCDE que teve como foco a integridade empresarial. Mesmo com inscrições livres e gratuitas, o evento não atraiu um grande público. Os que lá estavam eram brasileiros de ministérios, da CGU, de tribunais, de grandes empresas e uns poucos de entidades representativas de trabalhadores. Havia os estrangeiros membros de governos e de entidades multilaterais. Pouca imprensa. Umas 300 pessoas no máximo. Na abertura estavam representantes da ONU, OEA, Banco Mundial, OCDE, o Ministro da Transparência do Equador, o Ministro de Administração do México, o vice-presidente da Colômbia e o ministro da Controladoria Geral da República, Jorge Hage.
A corrupção é um fenômeno global, e por isso as iniciativas de maior vulto partem de organizações multilaterais, buscando estabelecer padrões de controle e supervisão entre os países. Tudo começou com o escândalo do suborno de ministros do Japão pela empresa americana Lockheed, na década de 70. Em seguida vários casos de propina entre empresas e países do primeiro mundo passaram a prejudicar a livre concorrência entre as empresas, e a causar grandes prejuízos aos países. Esses e outros aspectos da corrupção, associados ao tráfico de armas e drogas, lavagem de dinheiro e a aspectos ético-morais desestabilizantes de sociedades engrossaram os esforços que levaram à confecção da Convenção da ONU contra a Corrupção, que o Brasil assinou em 2003. Essa convenção foi ratificada por decreto presidencial de 2006 e deve ser cumprida pelo Brasil e pelos países-membros signatários. Virou lei para o Brasil.
O evento realizado em São Paulo foi muito denso e informativo. Um dos painéis tratava do preço pago pela sociedade pela corrupção. Empresas de grande porte como a Petrobrás, Siemens, Nokia e Philips mandaram representantes para falar das políticas e posturas anticorrupção adotadas no âmbito corporativo. A representante da Siemens falou do imenso prejuízo material e de imagem causado à empresa ao ser flagrada num escândalo de pagamento de propinas a autoridades de diversos países da ordem de US$ 1,4 bi. Só em multas e prejuízos, a empresa teve US$ 1,6 bi, fora os custos de processos, etc. Depois do ocorrido, a empresa resolveu tomar medidas para proibir as práticas anti-éticas e patrocinar um programa da ONU para a educação anticorrupção.
A idéia do encontro, onde a CGU tem a parceria com o Instituto Ethos, entidade empresarial com 12 mil associados com a missão de promover a integridade corporativa, é de estimular acordos setoriais de empresas para que não aceitem envolvimento em situações de suborno e corrupção, além de buscar um patamar ético para as disputas no mercado. Considero que essa é uma missão quase impossível, pois o capital não tem ética: escraviza, corrompe, mata, tudo em nome dos lucros acima de qualquer consideração moral ou ética. O máximo que se pode conseguir é uma "paz armada", onde todo mundo vigia todo mundo, até porque acordos amistosos entre concorrentes para dividir mercados significam cartelização.
Por um lado foi bom ter visto que há iniciativas institucionais para tentar freiar a corrupção, que carreia um bom pedaço do PIB mundial para o crime e submete países e pessoas à miséria. Por outro, ficou a impressão de utopismo da tarefa, pois tudo que se fez e se faz é embrionário, extremamente pequeno diante do problema, coisa de uma pequena vanguarda, e que não consegue trazer, até aqui, as pessoas comuns para uma grande mudança de posturas para eliminar a corrupção. A esperança está no sucesso do movimento que resultou na Ficha Limpa de candidatos ás eleições, que deu ao judiciário instrumentos para cortar pela raiz, mesmo que parcialmente, o acesso de corruptos às decisões sobre os recursos do estado.
sábado, 24 de julho de 2010
Combate à corrupção : pingo d'água no oceano
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