Hoje varria o quintal e me ocorreu um "insight": por que a eleição se polarizaria entre dois candidatos sisudos, representando dois projetos que apresentam poucas nuances entre si, se em 2002 elegemos Lula bem mais diferenciado politicamente do que é hoje? Quem seria o portador das esperanças que levaram à militância espontânea em torno de Lula? Quem seria o seu herdeiro, a pessoa que mais se aproxima de sua história de "filho do Brasil"? Certamente não são Dilma nem Serra, por razões e visões diferentes.
Essa eleição está descendo "quadrada" na goela de muita gente. Uns querem evitar o mal maior de ver tucanos e demos de volta, votando em Dilma porque é a candidata com maior chance de derrotar Serra. Incluo-me entre estes, porque vejo avanços no governo Lula. Até para os mais céticos, que não notam Lula revertendo as políticas deixadas por FHC, lanço a reflexão: se Serra tivesse ganhado em 2002, o patamar de perdas de direitos não seria o atual, mas muito abaixo, porque a política de arrocho ditada pelo Consenso de Washington exigiria isso e os tucanos fariam exatamente o que mandassem, piorando mais para os trabalhadores.
Poderíamos chegar a 2010 com muito menos que FHC nos deixou em 2002. É o que consola, quando vemos que no Banco do Brasil, onde trabalhei, só se repôs a inflação no salário, sem a reposição de mais de 80% de perdas, sem reverter a maldade da perda de isonomia dos novos funcionários, sem respeitar a jornada de seis horas. Bem, com mais 8 anos de tucanos continuaríamos no congelamento salarial, basta ver o que pena o funcionalismo de São Paulo com 20 anos de tucanato mandando por lá. E bancos, eles privatizaram ou venderam tudo. O BB a esta hora teria a logomarca do Bradesco, do Santander ou do HSBC.
Se Dilma é a continuação de Lula, sem o seu carisma, Serra é a certeza da continuidade de FHC, e isso não interessa a muita gente. A candidatura demo-tucana está fazendo água, e a postura do pré-candidato tem deixado margem a críticas até da imprensa sua aliada. Noutro dia falou em aumentar o tamanho do estado, em parar de privatizar, em ampliar programas de transferência de renda, e isso desagradou até a alguns colunistas da Globo. Agora a polêmica com a Bolívia, de difícil defesa pelos aliados da mídia, mostrando que o pré-candidato pensa baixo. E logo teremos um mar de esgoto saindo da campanha eleitoral de São Paulo, onde Mercadante pegará pesado contra os 20 anos de tucanato e poderá faturar a eleição em cima do Alkmin, o popular "picolé de chuchu". Serra ficará na berlinda, podendo cair mais nas pesquisas.
Serra não consegue um vice. O que seria ideal, Arruda, do DEMO, vez por outra é convocado para passar uns dias na concentração da Polícia Federal. O Aécio não topou, porque a lei do menor esforço manda que seja senador tranquilamente por Minas. O Tasso Jereissati não topou porque sua superexposição poderia trazer revelações negativas dos 20 anos de tucanato no Ceará, mesmo sob risco de não se reeleger senador. Tasso depende do PT não lançar o ex-ministro José Pimentel candidato ao senado, para ter chance eleitoral. Hoje dizia que queria um vice "que não o apurrinhasse". Fica difícil assim, talvez uma múmia topasse.
Se Serra não tem condições de subir mais, e Dilma conseguiu o feito de crescer nas pesquisas mesmo fora do governo há quase dois meses, sem os palanques de sempre, temos as eleições definidas? Não creio. Sem desprezar que o PT está se tornando uma máquina eleitoral do nível do PMDB, de mais profissionais que militantes, e isso já está trazendo retorno a Dilma, e sem considerar que Lula ainda não a pegou pelo braço e saiu por aí fazendo campanha prá valer, deduzo que Dilma não perderá votos para Serra. Nem para uma eventual inflação de outra candidatura. Ciro Gomes estava certo em querer ser candidato, porque poderia entrar nesse vácuo de oferta de produtos eleitorais, mas esbarraria no próprio passado e nas suas posturas destemperadas. Dilma deve crescer mais. Quanto? Dependerá do seu potencial, da qualidade eleitoral dos seus aliados, e do que os adversários poderão fazer para que não cresça e perca votos, se possível.
Marina Silva é uma pessoa sem problemas éticos, não se envolvendo em nenhum escândalo, mesmo no mensalão. Tocou seu mandato no senado e no Ministério do Meio-Ambiente com honestidade e seriedade, e bateu de frente com diversas áreas do governo Lula quando se propôs conservacionista, obstaculizando os projetos que o governo entendia como estratégicos para a retomada do desenvolvimento. Caiu quando não aguentou mais engolir sapos. Tem uma história de vida parecida com a de Lula, da pobreza ao poder sem máculas. Tem como vice um empresário que constrói a imagem de sustentabilidade nos produtos da sua empresa, e portanto seria um bom candidato complementar.
Marina não dirige o PV. Seu grupo é pequeno nas instâncias partidárias. Seu nome é maior que o partido, e certamente enfrentará boicotes à sua candidatura para que não cresça demais e comece a ameaçar os donos da legenda. Estes, por sua vez, nada têm de verdes. Estão bem maduros na política de direita, compondo onde podem com o PSDB e o DEMO. O PV está tensionado, com Marina candidata e o partido identificado com a direitona contra Lula o tempo todo. Marina não tem toda essa oposição ao governo Lula, mas para não aumentar a crise não se coloca como a sua continuação.
A mídia já percebeu que Serra sangra e pode ficar anêmico, diante de uma campanha pujante e vitoriosa de Dilma com Lula. Estão sem alternativa, como em 1989, onde chegaram ao ponto até de tentar lançar Silvio Santos candidato para barrar Lula, e acabaram abraçando Collor mesmo não gostando dele, porque era um populista perigoso, de vertente caudilhesca. Seu candidato poderia ser Ciro Gomes, mesmo não sendo o ideal, mas para o bem de todos e felicidade geral da nação o PSB abortou essa ameaça. Marina poderia preencher esse espaço?
Se Serra já era complicado para parte da direita, com alguns dizendo até que ele seria comunista (foi perseguido na ditadura, anistiado, etc), Marina seria muito mais, porque ninguém sabe prá que lado ela iria em caso de vitória. Se prevaleceria a sua vertente petista, fazendo um governo de quadros e base aliada do PT, já que o PV elegerá uma meia-dúzia, ou se o partido se imporia, forçando a política de alianças mais à direita, com o envolvimento do PSDB, DEMO e alijamento do PT da base de alianças. Marina só tiraria votos de Dilma afirmando o seu compromisso com a continuidade do governo Lula e comprometendo-se a manter os demo-tucanos fora do seu governo, com um discurso mais avançado de reforma sociais. Difícil, mas não impossível.
Ao meu ver, podem acontecer dois cenários: Dilma continuar crescendo com Marina crescendo sem tirar votos de Dilma, ou Dilma começar a ser afetada pela perda de votos em função do crescimento e eventual viabilização da candidatura de Marina. Claro, considerando que Serra não crescerá mais, que é a premissa de toda esta simulação. A maior tarefa da direita, no momento, é evitar a liquidação da eleição no primeiro turno, e nesse particular o crescimento de Marina é importante, pois não permitirá, salvo em caso de colapso da candidatura Serra, o que acho difícil, que Dilma chegue a mais de 50% dos votos válidos. Algo tipo Dilma 40%, Serra 35% e Marina 25%. Com Serra e Dilma no segundo turno, o espólio eleitoral de Marina seria o fiel da balança.
De qualquer maneira, arrisco-me a dizer que Marina não ficará no patamar que está. Uma parte da classe média descontente com Lula mas que rejeita os DEMO-tucanos como alternativa está em cima do muro, parte dela atualmente votando em Dilma por falta de opção. Acho que logo veremos Marina em torno de 20% nas pesquisas, e aí a criatividade da manipulação de números terá o céu como limite. A mídia poderá estimular a defecção de votos de Dilma em função de Marina, através da cessão de maiores espaços de propaganda, e trabalhar para uma disputa entre Marina e Serra. Bom, tudo isso é especulação, mas os próximos números das pesquisas, em especial a do Ibope, que são os mais fiéis aos oposicionistas, dirão se essa hipótese se realizará.
sábado, 29 de maio de 2010
Eleições 2010 : Marina deve entrar no páreo
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Caro Branquinho,
ResponderExcluirDiscordo de tua avaliação com base em um único argumento: O fiel da balança é Lula e sua candidata é Dilma. Marina cometeu um erro fatal, que comprometeu sua candidatura no nascedouro: Filiar-se ao PV, partido dominado por Gabeira e sua turma, para quem a vitória de Marina seria pior que a de Dilma. Não só não farão força por ela como trabalharão contra. Um outro erro ela comete sistematicamente: Criticar o PT, partido ao qual era filiada até recentemente. Soa mais como ressentimento do que convence. O eleitorado brasileiro, se ainda não é capaz de avaliar programas de governo, já superou o período das esmolas e avalia seu voto por sua condição de vida. Nessa perspectiva a indicação de Lula tende a ser imbatível.