quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Europa : Quem será a primeira Síria?

À medida que planos de austeridade econômica ditados pelo FMI vão sendo aprovados por parlamentos e começam a produzir efeitos devastadores sobre empregos, previdência e programas sociais nos países europeus, as reações ficam mais radicalizadas. Na Grécia o confronto está no nível de greve geral com pancadarias nas ruas. Em Roma, no sábado passado, uma manifestação pacífica "Ocupem Roma" descambou para a pancadaria e vandalismo, aparentemente pela infiltração de um grupo mais radical. Na Inglaterra, há alguns meses, uma espiral de violência explodiu, causando devastação em alguns bairros.

Tem muita pólvora espalhada, e qualquer centelha faz disparar distúrbios. A questão econômica está presente na "primavera árabe" e no "verão europeu". As frustrações e perdas fertilizam o solo da radicalidade em todos os países em crise. A questão que fica no ar é : qual será o primeiro país "democrático e civilizado" que usará tanques e munição real contra uma revolta do seu povo? Na hora que um  deles fizer isso, todo o discurso aplicado aos países produtores de petróleo como argumento para fomentar ações militares cairá por terra. Quando isso acontecer, haverá sanções, ou haverá "compreensão" para que não se deixe os banqueiros sem receber as sagradas rendas dos seus capitais?

Enquanto o governo brasileiro diz que não se deve comemorar a morte de ninguém e aposta no apoio ao novo governo para reconstruir a Líbia, o presidente norte-americano, Barack Obama, seguindo a linha sanguinária da execução de Osama Bin Laden, comemorou a eliminação de Kadhafi.

O editorial de Carta Capital levanta as preocupações com a irracionalidade que tomou as relações internacionais e com os  abusos aos direitos humanos para os quais as potências fazem vistas grossas em nome dos seus interesses maiores:


LÍBIA, PETRÓLEO E DEMOCRACIA
 
Quatro semanas de bombardeios intensos dos caças da Otan precederam a captura e morte de Kadafi, nesta 5ª feira, na Líbia.  Sirte, a cidade nuclear no centro das operações, foi reduzida a ruínas. Mais de 100 pessoas morreram nos últimos 10 dias. Há centenas de feridos e encarcerados. A violência não se limita aos combates.Um relatório da Anistia Internacional, de 13 de outubro, "Detention Abuses Staining the New Libya",denuncia a persistencia de prisões arbitrárias, sem julgamento, por parte de milícias incorporadas ao governo provisório rebelde. A prática da tortura é generalizada nas prisões, seja por vingança, seja como método sancionado de coleta de  informação. Se o Conselho Nacional de Transição (CNT) não der mostras de "uma ação firme e imediata", diz o Relatório da Anistia, a Líbia corre "um risco real de ver algumas tendências do passado repetirem-se.O documento resume as conclusões de uma delegação da Anistia Internacional que, entre 18 de agosto e 21 de setembro, recolheu os testemunhos de perto de três centenas de prisioneiros em 11 instalações de detenção da capital, Tripoli, bem como de Zawiyah e outras regiões do país. As imagens de Kadafi banhado em sangue, com o rosto desfigurado, morto após captura, ocuparam hoje um espaço de destaque, algo jubiloso, em veículos tradicionalmente empenhados em cobrar o respeito aos direitos humanos, sobretudo de regimes cujos governantes, em sua opinião, não comungam valores democráticos.  Carta Maior repudia a tortura, o arbítrio e a opressão --política e econômica, posto que são indissociáveis--  em qualquer idioma e latitude. Não se constrói uma sociedade justa e libertária com o empréstimo dos métodos que qualificam o seu oposto. A história dirá se o que assistimos hoje na Líbia atende às justas aspirações das etnias líbias por liberdade e justiça social, ou configura apenas uma cortina de fumaça feita de bombas e opacidade midiática para lubrificar o assalto das potências ao petróleo local.
(Carta Maior; 6ª feira, 21/10/ 2011)

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