A economia brasileira é muito estranha, até mesmo para economistas acostumados a prever o passado e a todo momento estranhar o que a realidade mostra. A notícia agora é a ascensão de mais 19 milhões de brasileiros à chamada Classe C, porta de entrada para a cidadania. É o segmento que sai da luta exclusivamente pela sobrevivência e enxerga a possibilidade de se parecer com a burguesia. Consegue comprar coisas, fazer reservas, viajar de avião, promover a felicidade sem a toda hora vender as panelas para comprar o jantar.
Agora são 53 % dos brasileiros em condições minimamente dignas. A pirâmide de renda do brasileiro saiu da forma de uma pirâmide, com uma imensa quantidade de pobres na base e um topo de minoria, e agora é um losango, com menos gente na base, a faixa intermediária de renda bastante robusta e o topo, como sempre, de minoria.
Ao mesmo tempo aparecem indicadores fantásticos: no ano passado, 50 mil estrangeiros, em especial técnicos, pediram vistos provisórios de trabalho no Brasil, com destaque para norte-americanos, em especial nas áreas de crescimento industrial; a taxa de desemprego despencou de 7,5% para 5,4%; o consumo de veículos e eletrodomésticos mantém-se aquecido mesmo com o fim das renúncias tributárias, com a redução de facilidades de crédito e elevação de taxas de juros; faltam profissionais para atender a vários setores do mercado de trabalho; não para de chegar investimento direto dos estrangeiros.
Apesar do crescimento rápido da renda, com as políticas de salário-mínimo acima da inflação e programas de transferência de renda, a economia não gerou uma inflação elevada para o que seria previsível, em parte por causa das importações. Não se deu o histórico "vôo da galinha", onde o país cresce um ou dois anos, e depois entra em recessão porque a inflação aumenta muito, porque a economia não aguenta a demanda. Além do mais, a inflação é um fenômeno mundial, porque alimentos, petróleo e minérios estão em alta. Para nossa sorte, é o que vendemos, permitindo a balança comercial se manter superavitária mesmo com o real extremamente apreciado.
Agora o desemprego começou a dar sinais de voltar a subir, o que pode ser sazonal, pois é assim todo início de ano. De qualquer forma, o governo está adotando políticas de arrocho orçamentário como forma de segurar a inflação, em doses que podem ser grandes demais para a "febre", muito por conta do lobby dos banqueiros e especuladores. Nunca tivemos condições tão favoráveis à queda dos juros reais e ao Brasil atingir o patamar de uma economia capitalista "normal", sem destinar boa parte do orçamento aao pagamento de juros. A arrecadação cresce batendo recordes, e em algum momento poderá se equilibrar ao gasto. Chega o momento do governo rediscutir a dívida soberanamente, e baixar os juros ou deixar de pagar aquilo que certamente é abusivo.
A propósito: como será escrita a história daqui a alguns anos, explicando a fase de progresso inédito do período Lula? Se os livros forem editados pela Abril ou pela Globo, deverão ser como os que usei no ginásio, em plena ditadura, que tinham um buraco entre o período de Getúlio e a "Revolução" de 64. Hoje as notícias positivas e impressionantes aparecem como se fossem dados do mercado, sem nenhuma interferência política humana. Quando aparecem, são referidos aos "fundamentos" que teriam sido deixados por FHC.
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