O regramento civilizatório do trânsito não resiste à Lei de Gerson, aquela que diz que "tenho que levar vantagem em tudo, certo?". No Rio isso parece pior, porque já foi capital, carteirada era o poder corrente, etc. Mesmo 50 anos depois da capital ter ido para Brasília, ainda há resquícios desse tempo autoritário, até nas gerações que não viveram no período de capital, transmitido por hábitos e costumes dos mais velhos.
A memória do oportunismo da esculhambação política do passado, somado à cultura de domínio do público por agentes privados (traficantes, drogados, milicianos), além da covardia que impede os "donos da verdade" de enfrentarem os problemas de frente e recorrerem a outras pessoas que consideram mais humildes para humilhar, como válvula de escape da própria incompetência, dá na situação abaixo.
Sábado, 10h. Entro num auto-atendimento bancário no Rio. Discussão entre um senhor e o vigilante que trabalha no local. Assunto: cobrança por uma pessoa de "tarifa" para parar o veículo no "estacionamento exclusivo" do banco. Nível de discussão chegando quase às vias de fato. Platéia na fila assistindo à cena sem se envolver. No final, o vigilante recomenda ao cliente que busque o gerente na segunda-feira para reclamar, pois ele não pode fazer nada. Exaltado, o cliente sai bufando, vai até o carro, dá um trocado ao "guardador" e vai embora.
Conversei com o vigilante sobre o ocorrido. Ele tinha perfeita noção do problema: as tais "vagas exclusivas" são, na realidade, o recuo no meio-fio para estacionamento de carro-forte, onde há placa "área de segurança bancária", que fica indisponibilizado ao público através de cavaletes permanentemente colocados. Logo em seguida começa a área de Zona Azul, estacionamento rotativo, que tem um guardador caracterizado regularmente com colete, bloco de talões, etc.
O que era o problema do cliente: um aproveitador qualquer, em busca de trocados, "presta o serviço" de remover o cavalete que isola a vaga, abrido-a para os carros pararem a 45% em relação ao meio-fio, deixando a traseira fora do alinhamento das demais, com riscos maiores de acidentes por se projetarem sobre a faixa de trânsito. Pelo "serviço", o "profissional de organização urbana" pedia um trocado aos clientes, interessados no seu "trabalho".
Moral da estória: Não existem as tais vagas, que também não seriam exclusivas de clientes, porque seriam públicas, se abertas. O "serviço" de remoção irregular dos cavaletes concorre com o ordenamento de vagas do Zona Azul, e o "profissional" não pode achacar ninguém, o que na prática acontece. O vigilante do banco não é autoridade competente para resolver o problema de natureza pública, já que as vagas não são da instituição, nem ele é da Secretaria de Ordem Pública para dar jeito na situação. O cliente não pode ser arrogante de cobrar do vigilante por uma irregularidade da qual está sendo cúmplice. Enfim, uma sucessão de erros onde falta razão e sobra estresse. É nessas que o sujeito leva um tiro, uma facada, por motivo fútil.
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