terça-feira, 2 de agosto de 2011

EUA : A vitória de Pirro do Tea Party

Ontem as TVs americanas mostravam entrevistas com alguns deputados republicanos, em especial os da extrema-direita, do Tea Party, comemorando a "vitória" sobre o governo na questão da elevação do teto da dívida. Faziam crer que o acordo seria uma capitulação democrata, ao aceitar cortes orçamentários e deixar para depois a elevação de impostos. Cacarejaram, mas depois, na hora de selar o acordo, votaram contra... Para eles, o acordo é apenas um primeiro passo na direção certa, mas como não é o que querem, letra por letra, eles são contra. Uma vitória obtida a um custo muito elevado para os Estados Unidos, a tal da "vitória de Pirro"


Do outro lado, os democratas buscavam justificar seus votos nesse acordo, que apesar de preservar alguns programas sociais essenciais, como o Medicare, o Medicaid e o Social Security (previdência), permitirá cortes em setores do serviço público como educação, pesquisa, obras públicas, etc. Positivo também para os democratas é a imposição de cortes de 50% no orçamento de defesa, o que pode significar um recuo no belicismo americano no mundo. Ruim para os republicanos, em especial os mais tradicionais, que não são os cachorros doidos do Tea Party, porque da indústria bélica vem boa parte dos financiamentos de suas campanhas.

O fato é que o acordo foi ruim para os dois lados. Na votação da Câmara, a maioria dos democratas foi contra, e expressiva também foi a votação contrária dos republicanos. Então, porque a ênfase do Tea Party em cantar vitória? A dissonância vem da sensibilidade das pessoas comuns, já que 52% discordam do acordo. A popularidade de Obama praticamente ficou inalterada, enquanto pesquisas atribuem aos republicanos a atitude insana de jogar o país à beira do abismo para auferir dividendos políticos.

Para completar, no discurso de Obama agora há pouco, promulgando o acordo, ficou claro que essa "vitória" terá um custo muito alto para a direita. Ele disse que não se pode equilibrar orçamento apenas cortando gastos, sem mexer nos impostos, e principalmente estendendo à classe média os cortes de impostos que os ricos tiveram. A palavra "jobs" junto com "work" foram as que mais pronunciou, principalmente referindo-se ao processo de recuperação econômica que vinha acontecendo, a duras penas, e que agora será enfraquecido, com a necessidade de cortar obras, pesquisas e outros investimentos, demitindo gente, etc. Sua fala empurrou a conta dos problemas econômicos para os republicanos.

O Tea Party parece muito com um pessoal daqui do Brasil, que só quer saber de detonar tudo para ver se, das ruínas, consegue ganhar algum. Chantagearam o governo, com o prazo limite. Ficou patente que não tinham qualquer preocupação com o país, nem com as repercussões internacionais. Apenas queriam atacar Obama e ter uma vitória, mais como torcida que como partido.

Se dependesse deles, os Estados Unidos estariam agora dando o calote, tendo que pagar mais juros pela rolagem de dívidas, fechando as repartições públicas, deixando de pagar salários. Isso não é problema deles. São a pior expressão do individualismo americano, a voz do liberalismo extremo dentro do liberalismo geral. Nada de impostos, nada de esmolas para pobres. Quero o meu e que se dane o resto.

Dentro do próprio partido deve ter gente querendo ver a caveira deles, porque essa chantagem no fio da navalha terá um preço. Os velhos republicanos perderam muitas cadeiras no congresso para essa turma mais radical, e vão continuar perdendo, porque o discurso da xenofobia, da plutocracia, do belicismo e racista tem seu público nos Estados Unidos, em especial nas crises. A tendência é do crescimento do Tea Party dentro do Partido Republicano, mesmo que esse venha a definhar eleitoralmente.

Por mais que o americano médio seja uma caricatura dos Simpsons, dos Jetsons e dos Flintstones, preocupados apenas com o consumo e a competitividade sem qualquer entendimento sistêmico, em algum momento cometerão o deslize de pensar e descobrir que essa turma da extrema-direita é nociva a cada um deles. Como a relação do cidadão com o estado é quase no nível pessoal, sem articulações fortes em movimentos sociais, o máximo que fazem é votar no outro lado nas eleições seguintes, seja ele quem for. Quem disser que vai dar mais uma merreca ou um emprego, mesmo mentindo, terá o voto do cidadão mediano. Ideologia de classe só quem tem é o rico.

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