domingo, 29 de maio de 2011

DF : Especulação determina preços de imóveis?



O anúncio ao lado é de um prédio de apartamentos no bairro mais valorizado de Brasília, o Sudoeste. Qual o apelo do anunciante, a imobiliária do ex-vice-governador Paulo Octávio, que renunciou em meio ao escândalo que levou o governador Arruda à cadeia? Que tudo que lança garante uma valorização elevada, e aparentemente crescente, como se o novo empreendimento fosse superar os 539% do último empreendimento do gráfico.


É impossível isso? Em Brasília, não. Praticamente todas as terras onde ainda se pode construir estão em poder da Terracap, que é um órgão governamental, e de uns poucos proprietários privados, que adquirem as terras vendidas pelo governo a preços absurdos. A partir do preço monopolista da terra, vem o pequeno número de incorporadores, que agregam valores sem qualquer coerência de mercado aos imóveis. A relação estreita entre governo e especuladores cria a situação de baixa oferta, elevação dos preços e ofertas sempre por altos valores.

Esse modelo oligopolista acaba levando as demais terras e imóveis a valores incompatíveis com outras regiões do Brasil. Exemplo: no novo bairro do Noroeste, estão sendo oferecidos apartamentos na base de R$ 9.000 por metro quadrado. Mesmo que a construção de um apartamento de bom padrão ficasse na faixa de R$ 3.000 por m², outros R$ 6.000/m² ficariam para os empreiteiros, corretagens e terras do governo. Onde, no Brasil, se paga R$ 460 mil num apartamento de 48 metros quadrados, na planta? Certamente não é em nenhum lugar tomado pela poeira, sem qualquer infraestrutura por enquanto, como no futuro bairro do Noroeste.

No alto preço da habitação, formado a partir desse modelo, está o incentivo à invasão, ocupação e grilagem bastante comuns nas terras públicas e privadas do DF. Depois o governo vem e regulariza, através de venda direta. E na especulação também está a demanda por altos salários no setor público, que movimento 47,5% do PIB do DF. A corrupção também tem uma das suas componentes nisso.

Quem, assalariado do governo, tem R$ 3 milhões para comprar um apartamento em Brasília, sem muito luxo nem uma localização excepcionais, de 3 quartos com pouco mais de 100 m²? Daí vêm também os "auxílios-moradia" pagos a alguns servidores públicos de todas as área, acima de R$ 2.000.

Outra coisa interessante: um investidor que aplique R$ 1 milhão num imóvel para alugar, quanto terá que cobrar de aluguel? Para ter um retorno mínimo, o aluguel, condomínio e taxas pagas pelo locatário deverá cobrar, no mínimo, cerca de 0,8% ao mês, ou seja, R$ 8.000 mensais. Quem paga isso para morar num 3 quartos no Plano Piloto? Ninguém, ou seja, o proprietário acredita que o imóvel sempre valorizará em níveis elevados, compensando a perda de renda com locação.

Se um dia chegar ao poder um governo que saia fechando ministérios e arrochando o salário dos servidores, poderá haver uma longa estagnação de valores e mesmo estouro da bolha imobiliária. Ou entrar no Governo do Distrito Federal alguém que tenha a coragem de fazer ofertas de terras a preços baixos para projetos residenciais em larga escala. Ainda há quem defenda um trem-bala de Brasília a Goiânia, que fica a 120 km daqui, para permitir que as pessoas morem por lá, onde o valor dos imóveis e aluguéis é muito mais barato.

Assim, quem tem a última projeção para construir num bairro pode botar o preço que quiser e anunciar uma alta rentabilidade, descolada de qualquer racionalidade, mas aceita no mercado extremamente concentrado de Brasília. O mais interessante é que alguém sempre compra pelo preço oferecido, acreditando na infinita elevação de valores e em retornos certos.


4 comentários:

  1. Parabens, Branquinho, pelas excelentes observações. Realmente, essa especulação é vergonhosa! Uma grande incorporadora acaba de lançar apartamentos pequenos na 404 Sul. Prédio de 3 pavimentos, c/elevador, garagem, coberturas. Pasme... R$ 14.000,00/m2!!! Um vexame!!! Ótimo projeto de custo barato... obra de custo real... venda com lucratividade absurda! Vergonhoso!!! Existe um público (filhos de quem?) com dinheiro sobrando que "embarca" e diz que é isso mesmo... Um grande abraço!

    ResponderExcluir
  2. Muito bem, falta quem fale claramente disso na imprensa.

    ResponderExcluir
  3. Branquinho, tudo bem? Meu nome é Patrick (tripack@gmail.com), sou corretor de imóveis, e navegando pela internet achei seu blog e gostei da sua fala!

    Realmente existem algumas distorções quando o assunto é precificação de imóveis... mas gostaria apenas de ponderar alguns pontos, para somatizar na construção de toda sua argumentação.

    Você disse:
    "Quem, assalariado do governo, tem R$ 3 milhões para comprar um apartamento em Brasília, sem muito luxo nem uma localização excepcionais..."
    Na verdade, com 3 milhões você quase compra uma das coberturas mais caras do noroeste. Um apartamento de 100 metros, na asa sul ou norte deve estar variando entre 900.000 e 1.300.000 (o que já é bastante significativo).

    Você disse:
    "um investidor que aplique R$ 1 milhão num imóvel para alugar, quanto terá que cobrar de aluguel? Para ter um retorno mínimo, o aluguel, condomínio e taxas pagas pelo locatário deverá cobrar, no mínimo, cerca de 0,8% ao mês, ou seja, R$ 8.000 mensais."
    Realmente, o seu raciocínio está correto, porém, 0,8% representa uma alta rentabilidade de aluguel, em Brasília, historicamente, os alugueis giram em torno de 0,4% a 0,6% e nos casos de apartamentos muito caros (como o seu exemplo) podem até ficar abaixo disso.
    O que realmente motiva alguém a investir imóveis, é o fato de além do retorno do aluguel, o seu ativo ( o imóvel) valorizou em média 20% a.a..

    O que realmente me assusta, como profissional do mercado, e que as empreiteiras, imobiliárias e colegas corretores, sustentam a surrealidade de que esses níveis de valorização vão se repetir de forma contínua e segura pelos próximos anos. Quando se estuda o mercado financeiro, especialmente os fundos de investimentos, uma informação fica bem clara para o investidor (especialmente o com visão de curto prazo) "RENTABILIDADE PASSADA NÃO É GARANTIA DE RENTABILIDADE FUTURA".

    A tendência de qualquer mercado em vias de saturação é a normalização, a lei de oferta e procura e imperativa em qualquer mercado, chega a beirar a infantilidade os argumentos sofistas que são apresentados a sociedade. Mistura-se tudo, confundem as pessoas, tudo pelo capital.

    Desculpe abusar de seu espaço, mas é bom saber que existem pessoas como você que estão pensando o mundo e não apenas passando por ele.
    Abraços e sucesso com o blog!

    ResponderExcluir
  4. Caro Patrick,

    Agradeço por ter enriquecido com novas informações o texto. Desde que fiz o post, há um ano, algumas coisas mudaram. Está havendo um forte descasamento entre o que o proprietário pede e o que o mercado paga. Isso náo é só aqui. No Rio, onde passo parte do meu tempo, aconteceu uma bolha e agora há ofertas a preços que não se confirmam nas vendas. Mesmo no Noroeste parece que há uma pisada no freio. As previsões da especulação quando o bairro foi lançado, de metro quadrado na faixa de até R$ 18 mil, não se confirmaram. Na Asa Norte vejo imóveis comercializados por R$ 700 mil que são colocados à venda por R$ 1.400 mil. No ano passado cheguei a ver apartamento na Asa Sul oferecido a R$ 3 milhões.

    Concordo quando diz que a baixa rentabilidade de aluguéis se compensava com a valorização tida como líquida e certa, bem acima da inflação. Agora já noto pressões para aumento nos aluguéis, porque a bolha deve estar chegando à exaustão. Pode ser pelo aumento de oferta em lugares fora de Brasília. Pode ser porque os financiamentos muito caros vão exigir uma grande entrada, e ainda terão prestações muito elevadas. O que me parece é que o ritmo de valorização caiu, e os proprietários irão buscar aluguéis mais caros, que não encontrarão muito mercado.

    Obrigado por responder.

    ResponderExcluir