sábado, 19 de março de 2011

Dilma reitera política externa de Lula a Obama

O discurso de Dilma a Obama, reproduzido na íntegra abaixo, não traz nenhuma esperança à elite colonizada que habita os partidos de direita e a grande mídia. A Globo vem levantando a bola da ALCA contra o Mercosul. Dilma diz que o Brasil quer reforçar a Unasul e ter relações estratégicas com os vizinhos, e a partir daí conversa com os EUA. O discurso é pragmático, mas pontua questões fundamentais para o Brasil.


Dilma critica a política de desvalorização da moeda americana, que está trazendo problemas de apreciação excessiva do Real. Bate na política de protecionismo americano aos produtos brasileiros, como etanol, aço, alimentos, etc. Diz que as relações entre EUA e Brasil têm que ser de igual para igual. Que os americanos têm que aprender com os erros, e promover as mudanças necessárias no FMI e Banco Mundial, defendidas pelo Brasil. E que é urgente a ampliação do Conselho de Segurança da ONU, com uma vaga para o Brasil.

Dilma não falou em concessões, mas em parcerias em desenvolvimento de tecnologias portadoras de futuro e em educação. Um discurso diplomático bastante claro para que ninguém ache que veio por aqui botar ordem no galinheiro, como fariam há uns 8 anos atrás. Discurso é uma coisa, outra é a vista grossa que o governo brasileiro vem fazendo em relação à quebra de soberania a pretexto de dar segurança a Obama no país. A violência policial de ontem no Rio, e a que poderá acontecer amanhã, é de responsabilidade de Dilma e Sérgio Cabral. Não vimos isso no governo de Lula.

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"Excelentíssimo senhor Barack Obama, presidente dos Estados Unidos da América,
Senhoras e senhores integrantes das delegações dos Estados Unidos da América e do Brasil,
Senhoras e senhores jornalistas,
Senhoras e senhores,

Senhor presidente Obama,
A sua visita ao meu país me enche de alegria, desperta os melhores sentimentos de nosso povo e honra a histórica relação entre o Brasil e os Estados Unidos. Carrega também um forte valor simbólico.
Os povos de nossos países ergueram as duas maiores democracias das Américas. Ousaram também levar aos seus mais altos postos um afrodescendente e uma mulher, demonstrando que o alicerce da democracia permite o rompimento das maiores barreiras para a construção de sociedades mais generosas e harmônicas.

Aqui, senhor presidente Obama, sucedo a um homem do povo, meu querido companheiro Luiz Inácio Lula da Silva, com quem tive a honra de trabalhar. Seu legado mais nobre, Presidente, foi trazer à cena política e social milhões de homens e mulheres que viviam à margem dos mais elementares direitos de cidadania.

Dos nove chefes de Estado norte-americanos que visitaram oficialmente o Brasil, o senhor é aquele que encontra o nosso país em um momento mais vibrante.

A combinação de uma política econômica séria com fundamentos sólidos e uma estratégia consistente de inclusão fez do nosso país um dos mais dinâmicos mercados do mundo. Fortalecemos o conteúdo renovável da nossa matriz energética e avançamos em políticas ambientais protetoras de nossas importantes reservas florestais e de nossa rica biodiversidade.

Todo esse esforço, presidente Obama, criou milhões de empregos e dinamizou regiões inteiras antes marginalizadas do processo econômico. Permitiu ao Brasil superar, com êxito, a mais profunda crise econômica da história recente, mantendo, até os dias atuais, níveis recordes de geração de postos de trabalho.

Mas são ainda enormes os nossos desafios. Meu governo, neste momento, se concentra nas tarefas necessárias para aperfeiçoar nosso processo de crescimento e garantir um longo período de prosperidade para o nosso povo.

Meu compromisso essencial é com a construção de uma sociedade de renda média, assegurando oportunidades educacionais e profissionais para os trabalhadores e para a nossa imensa juventude, garantindo também um ambiente institucional que impulsione o empreendedorismo e favoreça o investimento produtivo.

O meu governo trabalhará com dedicação para superar as deficiências de infraestrutura, e não pouparemos esforços para consolidar nossa energia limpa, ativo fundamental do Brasil.
Enfim, daremos os passos necessários para alcançar nosso lugar entre as nações com desenvolvimento pleno, forte democracia e ampla justiça social.

É aqui, senhor presidente Obama, que enxergo as melhores oportunidades para o avanço das relações entre nossos países. Acompanho com atenção e a melhor expectativa seus enormes esforços para recuperar a vitalidade da economia americana.

Temos assim, como o mundo todo, uma única certeza: a de que o povo americano, sob a sua liderança, saberá encontrar os melhores caminhos para o futuro dessa grande nação.

A gentileza da sua visita, logo no início do meu governo, e o longo histórico de amizade entre nossos povos me permitem avançar sobre dois temas que considero centrais nas futuras parcerias que fizermos: a educação e a inovação.

Aproximar e avançar em nossas experiências educacionais, ampliando nosso intercâmbio e construindo progresso em todas as áreas do conhecimento é uma questão chave para o futuro dos nossos países.
Na pesquisa e inovação, os Estados Unidos alcançaram as mais extraordinárias conquistas nas últimas décadas, favorecendo a produtividade em diferentes setores econômicos. O Brasil, senhor presidente Obama, está na fronteira tecnológica em algumas importantes áreas, como a genética, a biotecnologia, as fontes renováveis de energia e a exploração do petróleo em águas profundas.

Combinar as nossas mais avançadas capacidades no campo da pesquisa e da inovação certamente trará os melhores frutos para as nossas sociedades. Tomo como exemplo o pré-sal, a mais recente fronteira alcançada pela tecnologia brasileira. Acreditamos que os enormes desafios de cada etapa da exploração dessas riquezas poderão reunir uma inédita conjunção do conhecimento acumulado pelos nossos melhores centros de pesquisa.

Mas, senhor Presidente, se queremos construir uma relação de maior profundidade é preciso também, com a mesma franqueza, tratar de nossas contradições.

Preocupam-me em especial os efeitos agudos decorrentes dos desequilíbrios econômicos gerados pela crise recente. Compreendemos o contexto do esforço empreendido por seu governo para a retomada da economia americana, algo tão importante para o mundo. Porém, todos sabem que medidas de grande vulto provocam mudanças importantes nas relações entre as moedas de todo o mundo. Este processo desgasta as boas práticas econômicas e empurra países para ações protecionistas e defensivas de toda natureza.

Somos um país que se esforça por sair de anos de baixo desenvolvimento, por isso buscamos relações comerciais mais justas e equilibradas. Para nós é fundamental que sejam rompidas as barreiras que se erguem contra nossos produtos – etanol, carne bovina, algodão, suco de laranja, aço, por exemplo. Para nós é fundamental que se alarguem as parcerias tecnológicas e educacionais, portadoras de futuro.
Preocupa-me igualmente a lentidão das reformas nas instituições multilaterais que ainda refletem um mundo antigo. Trabalhamos incansavelmente pela reforma na governança do Banco Mundial e do FMI. Isso foi feito pelos Estados Unidos e pelo Brasil, em conjunto com outros países. E saudamos o início das mudanças empreendidas nestas instituições, embora ainda que limitadas e tardias, quando olhada a crise econômica. Temos propugnado por uma reforma fundamental no desenho da governança global: a ampliação do Conselho de Segurança da ONU.

Aqui, senhor Presidente, não nos move o interesse menor da ocupação burocrática de espaços de representação. O que nos mobiliza é a certeza que um mundo mais multilateral produzirá benefícios para a paz e a harmonia entre os povos.

Mais ainda, senhor Presidente, nos interessa aprender com os nossos próprios erros. Foi preciso uma gravíssima crise econômica para mover o conservadorismo que bloqueava a reforma das instituições financeiras. No caso da reforma da ONU, temos a oportunidade de nos antecipar.

Este país, o Brasil, tem compromisso com a paz, com a democracia, com o consenso. Esse compromisso não é algo conjuntural, mas é integrante dos nossos valores: tolerância, diálogo, flexibilidade. É princípio inscrito na nossa Constituição, na nossa história, na própria natureza do povo brasileiro. Temos orgulho de viver em paz com os nossos dez vizinhos há mais de um século, agora.

Há uma semana, senhor Presidente, entrou em vigor o Tratado Constitutivo da Unasul, que deverá reforçar ainda mais a unidade no nosso continente. O Brasil está empenhado na consolidação de um entorno de paz, segurança, democracia, cooperação e crescimento com justiça social. Neste ambiente é que deve frutificar as relações entre o Brasil e os Estados Unidos.

Senhor Presidente, quero dizer-lhe que vejo com muito otimismo nosso futuro comum.

No passado, esse relacionamento esteve muitas vezes encoberto por uma retórica vazia, que eludia o que estava verdadeiramente em jogo entre nós, entre Estados Unidos e Brasil.

Uma aliança entre os nossos dois países – sobretudo se ela se pretende estratégica – é uma construção. Uma construção comum, aliás, como o senhor mesmo disse no seu pronunciamento sobre o Estado da Nação.
Mas ela tem de ser uma construção entre iguais, por mais distintos que sejam esses países em território, população, capacidade produtiva ou poderio militar.

Somos países de dimensões continentais, que trilham o caminho da democracia. Somos multiétnicos e em nossos territórios convivem distintas e ricas culturas.

Cada um, a sua maneira, temos o que um poeta brasileiro chamou de “sentimento do mundo”.
Sua presença no Brasil, senhor Presidente, será de enorme valia nessa construção que queremos juntos realizar.

Uma vez mais, presidente Obama, bem-vindo ao Brasil."

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