domingo, 14 de abril de 2013

Tesouros escondidos em negativos, slides e filmes

Aprox 1917, em Niterói ou Campos : meus bisavós,
avô materno (de farda), tios-avós e amigos
Houve tempo em que fotos tinham negativos. Nunca pensei em escrever isso mesmo ainda existindo os processos tradicionais de fotografia, mas a massa das novas gerações desconhece isso, e a cultura do descartável faz com que se jogue fora possíveis preciosidades dos seus antepassados. Isso é muito comum quando um parente idoso falece e se encontra em gavetas alguns envelopes com negativos, rolos de filme ou caixas de slides cujo projetor não existe mais e mesmo que fosse disponível poucos saberiam como usá-lo. Resultado: história de pessoas, locais e eventos jogados fora para sempre.

Tive a sorte de poder guardar tais registros ao longo de toda a vida, e de conseguir resgatar películas do acervo de meus avós maternos, onde encontrei até fotos de mais de 100 anos. Como a qualidade dos negativos foi preservada em envelopes esquecidos e nunca manuseados, um bom scanner consegue capturar em alta resolução os grãos e uma posterior edição faz o documento parecer novo. Sempre que posso pego uma pilha de negativos e trabalho no escaneamento, organização, datação, identificação de pessoas, em suma, na arqueologia da família que desperta curiosidades sobre a história em geral.

Documentos dos antepassados também contam muita coisa. Certidões de casamento, batismo, atestados de óbito, nascimento, declarações de imposto de renda, escrituras de bens, radiografias, receitas médicas, convites de festas, documentos de veículos, enfim, a pessoa pode morrer, mas seu passado continua disponível. E quando se trata de família esses objetos podem explicar o seu próprio passado, porque as decisões tomadas pelos mais antigos certamente te afetaram. Positiva ou negativamente.

Essas buscas podem te levar a deliciosos cafés com pessoas idosas que adorarão relembrar momentos. Ou a procurar fazer contato com pessoas com quem a relação não é tão boa assim, mas dispõe de grande memória para identificar pessoas, datas e locais. No fim todo mundo pode ganhar com isso, basta que se dê de brinde o resultado da pesquisa.

Os negativos (e positivos, no caso de slides), se estiverem em boa qualidade, são melhores que as fotos impressas. E trazem mais informações. Antigamente fotografia era muito cara. Para se ter idéia de um passado recente, há menos de 10 anos revelar um filme e imprimir fotos 9 x 15 cm estava na faixa de R$ 1  por foto. Hoje se consegue imprimir fotos em meio digital por R$ 0,30. Por isso os rolos de filme, e geral de 12, 24 e 36 fotos, eram cuidadosamente gastos. Sim, porque o filme também era caro!

Não tinha a facilidade de sair apertando o disparador como hoje, batendo milhares de fotos que podem ser instantaneamente vistas e descartadas. O mais próximo disso era a foto Polaroid, revelada na hora, sem negativo, caríssima.

Os rolos de filme, em geral, traziam numeração das fotos, o que permite que se sequencie historicamente os fatos, facilitando a datação. Um rolo trazia vários eventos, que podiam ter anos de distância entre si. Para quem tinha recursos mais modestos o jeito era revelar o filme e mandar imprimir apenas as melhores fotos, o que faz do negativo mais precioso ainda, pois pode-se encontrar material inédito.

Os slides eram a melhor maneira de expulsar visitas de casa, porque exigiam projetor, tela, organizar cada foto (sempre vinha alguma de cabeça para baixo ou invertida), tirar da caixinha, botar no pente ou carrossel, isso tudo no escuro. E invariavelmente paredes serviam de telas, com pregos, imperfeições, etc. Era cansativo. No final disso tudo, os slides e a história ficavam esquecidos. Pior: para fazer foto a partir de slide era preciso um processo intermediário, pois o filme era positivo, daí ter que ser feito o negativo para daí fazer a foto. Se era mais barato o slide, fazer fotos a partir deles era muito mais caro. Em geral, ninguém tem álbuns feitas a partir do material dos slides.

E as fotos que eram doadas? Simplesmente sumiam dos álbuns, a não ser que alguém tivesse a disciplina de procurar o envelope com o negativo em meio a uma porção deles, na película identificar a foto, ir à loja de revelação mandar fazer aquela foto, esperar alguns dias (ou até mais, quando não se fazia revelação no Brasil), buscar a cópia e entregar à pessoa. Era mais fácil tirar do álbum e dar de presente. Ou seja: as coleções de fotos das famílias certamente estão desfalcadas, e os negativos podem repor essas perdas.

Praticamente terminei todo o meu acervo, digitalizando inclusive as fotos impressas. Um trabalho épico, pela quantidade de elementos. Parti agora para as fotos dos parentes, afinal, todo mundo participava de quase tudo e havia mais de uma pessoa batendo fotos de outros ângulos. Agora a tarefa é hercúlea, pois há negativos de tamanhos grandes, que precisam ser escaneados por partes e depois fundidos por software especial. Há até negativos em chapa de vidro, para os quais não tenho uma solução ainda. Fora a sujeira que tem que ser removida antes do trabalho.

Quando contrasto uma foto impressa de 20 anos atrás com o negativo a qualidade da escaneada do negativo é muito superior. Além de tudo, como a impressão de fotos era um processo químico, os fixadores podiam não ser de qualidade, bem como o papel fotográfico, e a reação continuar com a ação do tempo, da luz, da temperatura, etc.

Fica a dica para não jogar fora o passado que pode estar guardado nesses pedaços de acetato. Até naqueles monóculos de quermesse. Quem sabe no futuro um parente ou amigo não se interessa e revela curiosidades da sua vida trazendo de volta as imagens das tuas origens? É uma viagem ao passado.


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